terça-feira, 25 de junho de 2019

O AVESSO DO SUCESSO, por Carlos Lula



Já ouviram falar da jornada do herói? Alguém com uma vida comum, que passa por algo inesperado, recebe a mentoria de algum mestre, se nega a ser escolhido para tal missão, volta atrás, assume seu papel e se torna o herói. Essa narrativa, que há séculos nos encanta em livros e filmes, todos nós conhecemos. Aqui, porém, quero falar um pouco do avesso desta jornada ascendente, falar um pouco sobre a verdade nua e crua que envolve o fracasso.

Pense bem, a caminhada que segue de sucesso em sucesso é a verdadeira história de ficção. Vivemos fracassos, muitos fracassos e depois de muitos fracassos nos aproximamos um pouco de alguma verdade sobre nós mesmos, sobre a vida. Fracassar é preciso. Mais do que fracassar, diria. Reconhecê-lo e, sobretudo, entendê-lo.

As nossas referências, quase sempre, baseadas em fama, riqueza, emprego dos sonhos, número de curtidas, família de comercial de margarina podem estar equivocadas. No fracasso é que descobrimos que estas coisas são secundárias, que a vida perfeita - tão bem explorada nas redes sociais – simplesmente não existe.

O fato de encarar a vida e descobrir os fracassos - não estando preparado - é uma das causas da saúde mental tão debilitada, da obsessão desenfreada pelo dinheiro, pela fama, pelo convívio social badalado e dos tantos relacionamentos fracassados.

Recriamos um tipo de vida que não existe. Nela, é preciso estar no topo, sempre bem, sempre feliz, sempre bem sucedido. A sociedade consome histórias de sucesso, espelhando-se nelas. O problema é desejar apenas o sucesso e, como é de se esperar, não saber lidar com o fracasso.

Talvez por ter desde cedo entendido o que é fracassar, tenha me tornado uma pessoa mais resiliente, capaz de rir de suas catástrofes. Falo sério. Uma das primeiras memórias que tenho de minha infância é minha terrível dificuldade em aprender a ler. Olhava para os colegas de escola, todos já lendo e começando a escrever, e me sentia completamente derrotado. Uma besta. Não fosse o estímulo de minha mãe naqueles primeiros anos, poderia ter criado uma enorme aversão à leitura, quando a vida me levou para o caminho completamente oposto.

Já perto do fim da vida, Jorge Luis Borges concedeu uma conhecida entrevista em que afirmava que o fracasso e o sucesso são impostores. Dizia ele que ninguém fracassa tanto como imagina e nem tem tanto sucesso como imagina. Além disso, o que importa o sucesso e o fracasso? No fim das contas, todos seremos esquecidos, dizia o argentino. Então, meus amigos, tranquilizem seus corações. Cometer erros não é apenas inevitável, mas necessário para entender nossos desejos e prioridades.

A trajetória da vida não é, nem nunca será, um festival de escolhas certas que fizemos. Isso descobrimos justamente a partir das decisões erradas. Sentir o gosto do fel, do fracasso e, a partir daí, fazer um novo percurso, uma postura diferente, que talvez te leve para onde você deseja ir, mas até chegar lá - algumas outras doses de insucesso.

E, embora a sociedade esteja vivenciando um comportamento onde a melhor vida tem a ver com sucessos materiais e visibilidade social, ignoramos o fato de que o fracasso faz parte do nosso progresso pessoal. Na verdade, até evitamos contar esta parte da história.

Estamos todos, assim me parece, inebriados pelo imperativo do sucesso na cultura da auto-ajuda. Uma falácia, me desculpem os que se deixam levar por isso. Você não encontrará felicidade em nenhum manual sobre como ser feliz. Você não terá sucesso apenas por ter lido o livro do fulaninho que agora ganha rios de dinheiro como palestrante. A “busca da felicidade” não passa de um clichê televisivo que só alimenta a infelicidade dos desesperados, nos diria João Pereira Coutinho.

O que nunca vão lhe contar nesses cursos é que o mundo é atravessado por contingências que não dependem da sua exclusiva vontade e nós mesmos fazemos parte dessa indeterminação. Uma oportunidade, uma crise? Há uma grande aleatoriedade em tudo isso. O humano, quando dele tiramos a ilusória capa de herói, não será rico, saudável, lindo, não terá muitos amigos e profundos amores. Na verdade, ele terá uma vida bem parecida com a nossa.

A corrida desenfreada em busca da felicidade resultará numa grande frustração, porque ela não será nunca encontrada. Ela apenas pode – e deve – ser vivida, sem explicação, sem regras. Quando encontrada, devemos aproveitar intensamente.

Então, calma, meus amigos.  O negócio é começar o dia e chegar ao fim dele satisfeito, sem paranoias sobre a irrealizável meta não cumprida, sobre os likes não conseguidos, sobre a barriguinha que insiste em estar ali. Sentir medo faz parte, errar faz parte, e nada disso precisa interromper sua satisfação consigo mesmo. Você não precisa exigir tanto de si. Ria do seu fracasso. Lembre-se dele. Tire ele do seu esconderijo e tome uma cerveja em sua homenagem.

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