"Não se assustem se alguém pedir o AI-5", disse
ministro ao comentar possibilidade de protestos de rua no Brasil. Menção
a decreto símbolo da repressão do regime militar gera reação de Maia e
Toffoli.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou nesta segunda-feira
(25/11) que ninguém deveria se assustar "se alguém pedir um novo AI-5"
– medida considerada o maior símbolo da repressão política durante a
ditadura militar no Brasil (1964-1985). A declaração ganhou ampla
repercussão no meio político e nas redes sociais nesta terça-feira.
Os
termos "AI-5" e "Paulo Guedes" apareceram no topo dos assuntos mais
comentados no Twitter, entre diversas manifestações de repúdio e também
de apoio à fala do ministro.
Em uma coletiva de imprensa em
Washington, Guedes afirmou que é necessário prestar atenção ao que está
ocorrendo no Chile e em outras nações latino-americanas e ficar atento
à possibilidade de que possa haver protestos em massa semelhantes no
Brasil.
Ao se referir aos discursos recentes do ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva, em que o ex-mandatário, recém-solto da prisão, convoca a
população para ir às ruas, o ministro pediu que haja mais
responsabilidade.
"É irresponsável chamar alguém pra rua agora
pra fazer quebradeira. Para dizer que tem que tomar o poder. Se você
acredita numa democracia, quem acredita numa democracia espera vencer e
ser eleito. Não chama ninguém pra quebrar nada na rua", disse, segundo
reportagens da Folha de S.Paulo e da BBC News Brasil.
"Ou
democracia é só quando o seu lado ganha? Quando o outro lado ganha, com
dez meses você já chama todo mundo pra quebrar a rua? Que
responsabilidade é essa? Não se assustem então se alguém pedir o AI-5",
declarou.
O Ato Institucional nº 5 (AI-5) foi editado em 13 de dezembro de 1968
pelo então presidente Artur da Costa e Silva, um dos cinco generais que
governaram o país durante o regime militar. Em vigor até dezembro de
1978, a medida resultou no fechamento do Congresso Nacional e na
suspensão de direitos políticos.
"Eu acho prudente quem ficou
tanto tempo no governo praticar um pouquinho de democracia, né? Agora
que os outros ganharam, deixa eles seguirem um pouco, até pra consertar
um pouco, pra eu voltar e quebrar tudo de novo. Se não, não vai ter o
que quebrar. Então vamos praticar a democracia, o poder troca logo, só
esperar três anos, ganha a eleição e volta", disse Guedes ainda sobre
Lula e o PT, segundo a BBC.
Segundo o ministro, o presidente Jair
Bolsonaro estaria preocupado com a possibilidade com que ocorressem no
Brasil manifestações como as que ganharam as ruas em países como como
Chile, Bolívia e Colômbia. Guedes afirmou, porém, que "o presidente tem
um ótimo instinto político, tanto que ganhou a eleição contra tudo e
contra todos".
Após quase duas horas de entrevista coletiva, o
ministro disse aos jornalistas que se arrependeu de mencionar o AI-5 e
que estava falando em "off", segundo a Folha e a BBC.
"Vocês querem tocar fogo no Brasil?", perguntou, temendo a
repercussão de sua fala. "Ministro Paulo Guedes diz 'não sei o que'. Ele
[Lula] no dia seguinte está lá 'bláblabla'. Eu digo: 'Olha, é o AI-5
mesmo, cara'", citou a BBC.
Ao ser questionado se achava
admissível a instauração de alguma medida nos moldes do AI-5 nos dias
atuais, o ministro negou. "É inconcebível, a democracia brasileira
jamais admitiria, mesmo que a esquerda pegue as armas, invada tudo,
quebre e derrube à força o Palácio do Planalto, jamais apoiaria o AI-5,
isso é inconcebível. Não aceitaria jamais isso. Está satisfeita?", disse
à repórter.
Foi a terceira menção ao AI-5 em menos de um mês por
parte de pessoas do círculo de Bolsonaro. No final de outubro, um dos
filhos do presidente, o deputado Eduardo, disse em uma entrevista que,
se a esquerda brasileira "radicalizar", a resposta pode ser "via um novo
AI-5".
Pouco depois, foi a vez do general Augusto Heleno, que
chefia o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), afirmar, com base
nas declarações de Eduardo, que era necessário "estudar como vai fazer,
como vai conduzir" um hipotético novo AI-5. "Acho que, se houver uma
coisa no padrão do Chile, é lógico que tem de fazer alguma coisa para
conter", disse.
Assim como havia ocorrido no caso de Eduardo e
Heleno, a fala de Guedes gerou reação no meio político e no Judiciário.
"O AI-5 é incompatível com a democracia. Não se constrói o futuro com
experiências fracassadas do passado”, disse o presidente do Supremo
Tribunal Federal, Dias Toffoli, em Maceió, segundo o jornal Folha de
S.Paulo.
Já o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que as falas
recorrentes sobre o AI-5 por parte de membros do círculo de Bolsonaro
está provocando insegurança.
"Tem que tomar cuidado, porque se
está usando um argumento que não faz sentido do ponto de vista do
discurso, e como não faz sentido, acaba gerando insegurança em todos nós
sobre qual é o intuito por trás da utilização de forma recorrente dessa
palavra", disse Maia.
FONTE: DW
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